O
mestre do terror consegue, mais uma vez, construir uma atmosfera opressiva de
medo em sua obra It – A Coisa. As cenas dramáticas e assustadoras descritas por Stephen
King na morte principalmente de crianças e nas descrições de enfrentamentos à
Coisa proporcionam inquietantes situações de suspender o fôlego, de entesar os músculos
e alterar a respiração. E a personagem aterradora do Mal é a alegre, debochada e extremamente
mal cheirosa figura predominante de um palhaço, ora lobisomem, ora múmia,
ora outra coisa, dependendo do garoto que se deparava com ela e seus
antecedentes de figuras aterradoras.
Isso
tudo num livro. Não quero aqui entrar no mérito do filme, mas no de um livro de
1.104 páginas; sem música tenebrosa e outros efeitos sonoros e visuais,
é uma magistral consumação do medo, digna de um catedrático no assunto. E, apesar disso, King consegue apresentar-nos
belíssimos sete protagonistas, crianças pré-adolescentes, que desenvolvem e
expõe o real sentido da amizade, do amor, da confiança absoluta e, claro, do
medo.
Some-se
ainda a forma narrativa (objetiva e subjetiva), com a alternação da ordem
temporal - usando a anisocronia; a construção dos protagonistas e dos demais personagens
e antagonistas; os locais, as situações predominantemente tensas, os acontecimentos
surpreendentes, as ocorrências que extrapolam os limites da violência, as
apavorantes perseguições (e não são poucas), as reviravoltas, os dados
históricos e geográficos, e até o lirismo de algumas situações, tudo banhado em muita insegurança,
sangue e medo. Aqui, nada é previsível e tudo é inusitado. Quem gosta do gênero
e do estilo de King não conseguirá largar o livro.
Todo
esse crescente terror a buscar um ápice na apoteose da obra, presume-se, em seu
quinto final, onde, inevitavelmente o Bem enfrentará o Mal de forma decisiva. E
aí? O Bem vencerá o Mal? Ou tudo se converterá naquela babaquice de que algo
sobre para um retorno do Mal numa próxima aventura? Aí não seria King.
Mas,
por incrível que possa parecer, apesar da continuidade de todas as qualidades
aterrorizantes descritas anteriormente até o fim da narrativa, King tropeça. E
a sensação é a mesma de um coito interrompido por uma circunstância esdrúxula.
Você começa a brochar e resta apenas continuar curtindo o texto, sempre muito
bom do autor, até o final, por que o enredo foi comprometido.
O encontro apoteótico do Bem com o Mal decepciona. Era de se esperar
algo mega-assustador. E o que se encontra é medíocre diante do brilhantismo das
situações anteriores já descritas. King partiu para uma solução metafísica e foge totalmente do âmago da obra, saindo do clima
aterrorizante para entrar numa atmosfera fantasiosa, com situações meramente
forçadas, sem brilho, descrições cansativas e, o pior, sem o apreciado terror
kinguiniano, sem a múmia, sem o lobisomem e sequer o esperado embate com o palhaço,
ícone ilustrativo de todo o Mal da obra que se transforma numa ridícula e imensa
aranha coadjuvada por uma milenar e filosófica tartaruga.
Enfim, é uma obra artística e como tal deve ser respeitada. E com
toda minha reverência por Stephen King, acredito que esta crítica positiva é
cabível, pois ele é o único responsável pelo que transmite ao leitor. E ninguém
é perfeito. Nem eu, que me atrevi a escrever esta crítica.
Por Valdemir Martins
Novembro de 2017.
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