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13 de jan. de 2023

Nunca deixe de ler Nunca

Nesta que talvez seja a obra mais política e crítica de todas as que li do consagrado Ken Follett, desde seu princípio uma simples palavra incomodou-me como se estivesse lendo com cisco nos olhos. Trata-se do vibrante romance Nunca, onde um de seus principais personagens é Pauline Green, então presidente dos Estados Unidos, mas tratada irritantemente, ao longo das 624 páginas, pelos tradutores, na publicação da Editora Arqueiro, como “presidenta”. Por não ser usual e ter seu curso restrito no idioma em se tratando de Brasil, essa palavra incomodou-me bastante.

Mas, apartando o incômodo, o livro surpreende – como sempre, em se tratando de Follett -, ao trazer-nos a intriga internacional desta vez envolvendo, americanos, franceses, chineses, sul e norte-coreanos, jihadistas, chadianos, sudaneses e japoneses. Os serviços secretos, marca central de boa parte de seus livros, faz-se presente com força neste trabalho, com todas as suas modalidades de atuação, desde a mais inteligente até a mais brutal. É, com certeza, a obra mais ficcional de Follett.

A ideia deste enredo, segundo o autor, surgiu a algum tempo, quando pesquisava dados para escrever Queda de Gigantes, primeiro livro da espetacular trilogia O Século (veja comentário em https://contracapaladob.blogspot.com/2018/07/o-mundo-que-ainda-nao-terminou-1.html ). Como nesse livro, este trata de uma guerra indesejada, mas que tornou-se inevitável. O que nos alerta para repensar as dimensões da atual guerra entre Rússia e Ucrânia como um presságio terrível, tornando a obra uma leitura indispensável.

Numa narrativa simples, com ritmo inicialmente lento que vai progredindo até uma narrativa avassaladora e angustiante, a obra abrange política internacional, armamentos modernos, tráfico de pessoas, drogas e armas, bem como trata de xenofobia, terrorismo e estratégias e táticas militares. Os personagens são muito bem desenvolvidos e extremamente instigantes.

As revelações de esquemas e procedimentos escusos e inescrupulosos de ditaduras africanas e asiáticas, bem como a violência dos governos socialistas e comunistas pelo mundo, são outro ponto forte na trama, já que Follett é um profundo pesquisador para sempre embasar suas histórias em dados reais, suas colocações são perfeitamente críveis.

Por ser um romance atual, contemporâneo, a competência de Follett leva-nos a reflexões importantes sobre a inescrupulosa imprensa sensacionalista e militante, algo bastante atual e presente nas importantes democracias ocidentais. Não sem motivos, a personagem presidente é uma inteligentíssima e sensível democrata do partido Republicano ianque que sofre ataques idiotas de políticos e da imprensa domésticos. Algo também hoje comum no mundo ocidental.

Ao introduzir mais uma presidente de uma república asiática, igualmente volta a ser usada a palavra anômala “presidenta”, ali colocada pelos tradutores. E o autor reforça, a seguir, sutilmente a irresponsável atuação da imprensa sensacionalista ao redor do mundo, sempre fomentando discórdia para manter alta audiência.

Follett leva-nos para uma crise política mundial sem paralelo ou imaginação anterior, obrigando-nos a não largar a leitura, tamanha a ansiedade. Apenas abranda-a com flashes familiares e românticos como só ele sabe fazer.  E nesse tom, leva tudo, tudo ao seu limite, tornando o final do livro uma agonia insuportável. E seu final é surpreendente e exatamente compatível com o teor da trama.

Leitura fortemente recomendável por suas qualidades de construção, diálogos inteligentes e dinâmicos, graus de informações atualizadas e níveis de sensações emocionais de alto volume.

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Valdemir Martins

12.01.2023

Ilustrações: 1. Capa Editora Arqueiro; 2. Salão Oval da Casa Branca; 3. Lago Chade; 4. Congresso do Partido Comunista Chinês; 5. O Deserto do Saara; 6. Sede do Governo da Coréia do Norte; 7. Explosão nuclear; 8. Ken Follett.

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