Em sua mais recente obra Klara e o Sol, o Nobel inglês Kazuo Ishiguro escasseia. Depois de ler
seus brilhantes e monumentais O Gigante
Enterrado e Os Vestígios do Dia,
sente-se que sua caçula carece de Ishiguro e de seus méritos literários.
Numa distopia contemporânea, o livro versa sobre a vida de
uma robô, Klara, mais propriamente uma
humanoide com inteligência artificial em meio a uma família. Explora o autor
essa convivência, apresentando as linhas de pensamento, ações e reações dos
seres humanos em diversas circunstâncias e situações, contrapondo às singelas e
racionais reações da humanoide a tudo isso em suas vidas em comum, num mundo onde as
relações são rasas e descartáveis.
Estará a mediocridade humana – que se acentua a cada década –
preparada e capacitada e entender, acompanhar e conviver com as obras da
inteligência artificial, resultado do acelerado desenvolvimento tecnológico
produzido pelos gênios humanos? Neste livro Ishiguro destaca exatamente as
facetas dessa vida em comum, demonstrando que os robôs com inteligência
artificial, por não conterem sentimentos, são muito mais assertivos do que os
humanos. Em especial, sua protagonista Klara.
Exatamente no início do terço final da obra, o enredo dá uma
reviravolta positiva, saindo de um certo marasmo e da simplicidade rotatória de
construção da trama, e surpreende-nos com novos personagens e novas e fluentes
situações, encaminhando-nos ao crepúsculo do livro. É nesse trecho que
descobrimos dois personagens coadjuvantes – mãe e filho – literariamente muito
mais ricos que as outras pessoas, por serem absolutamente mais autênticos e compassivos.
Também é nesse trecho que um robô faz uma oração por uma menina, fato
deslembrado para um humano em todo o enredo, apesar dos inúmeros problemas que
enfrentam.
Numa de suas deduções – sempre lógicas – Klara perscruta e conclui que “talvez todos os humanos sejam
solitários. Ou pelo menos possam se tornar.” É a premonição comum, até em
nossos dias, do que espera o futuro das novas gerações humanas. No caso deste
livro futurista, crianças e adultos são realmente solitários. Por modificações
genéticas, chamadas elevações, as
crianças e jovens acabam necessitando da companhia de robôs, os AAs (Amigos
Artificiais) para se desenvolverem.
Finalizando, segundo minha percepção, um livro aborrecido em
muitos trechos, inclusive de carente estruturação textual e de baixa qualidade
literária. Segundo a crítica Isabella Siqueira, “Ishiguro conduz com muita graça a trajetória de uma humanoide mais humana do que
muitos por aí sonham em ser.” Enfim, trata-se de um
bom romance sobre a complexidade das emoções humanas e de suas criações
tecnológicas, mas indigno de um autor premiado com o Nobel de Literatura em
2017.
Valdemir
Martins
18.05.2021
Fotos: 1. capa do livro; 2. drone pássaro de um personagem; 3. o crepúsculo que inspirou Klara; 4. Kazuo Ishiguro.
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