Afinal, o que é música para você? Talvez aquele som
agradável, rítmico, cantado ou não, que o (a) faz dançar, cantar e lhe traz alegria,
tristeza, recordações; ou então outro som harmonioso, gerado por um, poucos ou
muitos instrumentos e/ou vozes, com características e variações técnicas que
mexem com seu âmago, seus sentimentos, transmitindo-lhe as mais diversas
sensações, como alegria, tristeza, suspense, flutuação, sonhos, uma história.
Seja música popular ou erudita, ambas são incrivelmente
benéficas para nós. Mas apesar de a música erudita – que nos faz bem à alma – não
ter a preferência da maioria, tem popularmente o nome destacado de compositores
como Bach, Beethoven, Chopin e Mozart pelo fato de algumas de suas obras serem
mais utilizadas midiaticamente em eventos, filmes, televisão e até em
comerciais. Algumas até caíram no gosto popular, seja por sua beleza, seja pela
repetição. Mas, excetuando-se os estudiosos, poucos sabem quem é ou o que representa
o genial e brilhante maestro Liszt para a música de verdade.
Seja como for, para ler “Rapsódia Húngara”, do escritor
húngaro Zsolt Harsányi, completamente ignorado por aqui, você vai precisar
conhecer um pouquinho sobre música e, principalmente, gostar dos assuntos
música clássica e história. Trata-se de um livro de rara beleza estética, pois
nos insere numa reflexão a respeito
da beleza sensível e do fenômeno artístico, assim como um fato
filosófico, gerado por consagrados compositores do século XIX, época de ouro da
música erudita. E, para não parecer radical, confesso que o livro pode ser lido
também pelos que gostam de biografias, romances de amor ou simplesmente de
história, mesmo sem embasamento musical. Aliás, este foi o livro favorito de Anne Frank em
seu cativeiro, fato que me levou a lê-lo.
A
obra leva-nos à biografia de Franz Liszt. E, como Liszt, seu autor era húngaro e, apesar de
desconhecido no presente, criou um livro muito bem escrito, com grande valor
literário e histórico. Harsányi ressuscita o grande músico, pintando-o com
carinhosa naturalidade, fazendo-o viver com todas as suas humanas virtudes e
fraquezas. Afinal Lizt foi um dos mais importantes compositores e singular
virtuose do piano de todos os tempos. A vida de Liszt é um verdadeiro romance e
Zsolt soube recriá-lo em toda sua pulsante realidade, como um psicólogo de
arguta penetração.
Nascido em Raiding no interior da Hungria, em 1811, aos nove
anos Liszt já dava seu primeiro concerto e tinha catorze apenas quando escreveu
para a ópera um trabalho em um ato, “Dom Sancho ou O Castelo do Amor”. Aos 11 anos, num concorrido concerto em Viena,
foi aplaudido e cumprimentado pessoalmente pelo já veterano Beethoven. Católico
fervoroso, cresceu, estudou, enriqueceu e evoluiu como artista e líder viajando
toda por toda Europa. Como pouco viveu na Hungria, não sabia sua língua natal.
Sua base de vida maior foi Paris, onde fez grande amizade com George Sand, Victor
Hugo, Lamartine e, sobretudo, com os inseparáveis parceiros Chopin e Berlioz.
Foi admirado e reverenciado por inúmeros músicos, pela nobreza européia e até
por monarcas de diversas nações.
Em 1847 Liszt, convidado pelos
soberanos alemães, aceitou o cargo de mestre de capela em Weimar, cidade de
Goethe e de Schiller. Lá criou o poema sinfônico e escreveu considerável número
de obras, entre as quais seus 14 poemas sinfônicos. Empregou toda a sua autoridade
para tornar conhecidas as obras de Wagner, seu idólatra, cujo “Lohengrin” fez
representar pela primeira vez. Wagner o venerava e Liszt apostava nele como um
revolucionário da música, promovendo, apoiando e prestigiando-o sempre que
possível.
Era um cobiçado homem bonito e não resistia a uma bela mulher. Casou-se não oficialmente
com três delas, lindas e de forte personalidade. A música sempre o separou de
seus filhos. E, Cósima, uma de suas filhas, casou-se atribuladamente com
Wagner, dando-lhe, além dos netos, inúmeros aborrecimentos. Passou seus últimos
anos entre Roma, Weimar e Budapeste, festejado como nunca o fora nenhum outro
músico. Morreu em Bayreuth, na Baviera, aos
74anos.
Não há, infelizmente, novas edições para este valioso livro.
Apenas as editoras Globo (RS 1944) e Melhoramentos (Coleção Caminhos da Vida,
volume 28, de 1954). E por incrível que pareça, vários exemplares podem ser encontrados
no site Estante Virtual, a partir de – acredite – R$ 4,00. Se você gosta de
música e de história, não perca esta chance.
Valdemir Martins
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