A pessoa que se propõe a ler Sapiens – Uma Breve História da
Humanidade
(Companhia das Letras),
do
professor e historiador israelense Yuval Noah Harari, com certeza é instruída. Uma obra monumental escrita de forma fluente, de
fácil leitura e assimilação, Sapiens
é uma deliciosa proposta de completar seus conhecimentos e surpreende o leitor
ao mostrar quanto ele não sabe. Claro, a não ser que ele seja também um expert
como Harari.
A leitura é aderente e não se consegue largá-la com
facilidade. Tem-se a sensação de estar lendo algo sempre relativamente familiar
no geral, mas os liames científicos, históricos, culturais e religiosos são
permanentemente surpreendentes e muito esclarecedores. E uma das qualidades da
obra é alertar leitores despreparados para entender e aceitar rompimentos de
tabus culturais e religiosos, principalmente estes que via de regra estão
fortemente inoculados na mente e na tradição – ou na cultura, como se refere
Harari – da maioria das pessoas.
Queiram ou não Adão e Eva, a vida principia-se há cerca de
3,8 bilhões de anos, a partir de simples moléculas e depois micro-organismos
aquáticos que se tornaram hoje complexos seres cheios de crenças e conhecimento
e não sabem muito bem distinguir o que é um e outro. Quem respira as crenças
impele a cultura e a história para trás. Quem evolui com o conhecimento, está
mais para destruidor inconsciente (ou não) da cultura, das crenças e da vida
como a conhecemos.
O autor é convincente o suficiente para nos mostrar que o
dinheiro não existe. Está apenas na mente das pessoas que, assim, com essa
crença, sustentam os mercados, os bancos, os governos e as nações. Aqui se
entenderá também o porquê de as civilizações ameríndias permutarem ouro por
bugigangas, certas e conscientes de que faziam trocas vantajosas. Entenda por
que os poderosos impérios ruíram em batalhas na antiguidade e na paz na
história recente (como o inglês e o francês). O macaco é realmente nosso
ancestral? E qual o papel do Neandertal nessa transmutação?
Perceba e assimile a destruição gradativa de nossa
naturalidade com a evolução tecnológica que tende a nos escravizar em sua
dependência quase que total. Ou você vive hoje sem um smartphone, um satélite,
um automóvel, um medicamento, um computador ou um chip? Ou não vai depender da
evolução das tenebrosas pesquisas genéticas? Já parou para ponderar que o
remédio para a cura do Alzheimer pode trazer consigo a fantástica e perigosa
evolução e aperfeiçoamento da mente humana que pode vir a subjugar seus
semelhantes. Imagine um instrumento da inteligência artificial, no futuro,
fazendo o backup do seu cérebro e rodá-lo num PC para qualquer outro fim.
Assustado? Já deu para perceber que o livro é muito sério,
não é mesmo? E tudo é tratado com embasamento histórico e científico. O máximo
que o autor se aproxima da ficção está em suas considerações e projeções das consequências
das evoluções da tecnologia. Para sua própria reflexão, considere que o título
do epílogo do livro é: “O animal que se tornou um deus”.
Harari é considerado hoje um dos grandes pensadores do século
21. E trata o leitor não como um ignorante das coisas, mas considera que você
sabe e entende muito, mas talvez não perceba e não sopese o contexto e o
conjunto dos fatos que conhece. Daí seu empenho de certa forma didático em
analisar a história da humanidade de forma simples e objetiva, o que torna o
livro um prazer de leitura. É um daqueles raros livros que você fecha no final com satisfação e sabendo que mais cedo ou tarde voltará a folheá-lo.
Valdemir Martins
20/10/2018
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