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30 de mai. de 2025

1222: uma baixa altitude para o que se espera de um suspense.

Às vezes nos perguntamos como será a vida de um cadeirante. E um bom exemplo de resposta encontramos no livro 1222, um romance policial de suspense da premiada escritora norueguesa Anne Holt. E tudo tem início a partir de um acidente ferroviário a 1222 metros de altitude, ao lado de um hotel, entre Oslo e Bergen, e durante uma forte tempestade de neve; um furacão, segundo a autora.

Por aí, tem-se uma perspectiva do que poderá acontecer aos 269 passageiros do trem, dentre os quais vai destacar-se como protagonista a inspetora de polícia inválida e aposentada Hanne Wilhelmsen, cadeirante por acidente em ação.

Um texto que a princípio parece-nos confuso ou mal traduzido, auxilia na criação do clima desordenado que ambienta a reunião dos passageiros num antigo hotel próximo ao acidente. Mortes vêm tumultuar a convivência dos passageiros, presos no hotel em função de uma tempestade de vento e neve jamais vista na Noruega. E Hanne, não querendo envolver-se, não consegue segurar seu raciocínio lógico de policial e acaba por implicar-se.

A autora, que é homossexual, acaba defendendo o amor e o casamento lésbico e os muçulmanos, origem da companheira da protagonista. Transforma um acidente num thriller psicológico sem sustos ou surpresas, às vezes até monótono e repetitivo, patinando numa narrativa de busca entre o etéreo e o inócuo. Simplesmente sem emoção. E caminha para um final previsível diante de tantas pistas colocadas por Holt.

Queiramos ou não, a tempestade de neve torna-se uma segunda protagonista por força de sua influência nos rumos da história.

Mas, enfim, o livro não responde à pergunta inicial de como será a vida de um cadeirante, mas dá-nos a possibilidade de poder imaginá-la. Assim como passamos todo o tempo de sua leitura imaginando os tipos diferenciados que percorrem o enredo e seu eventual envolvimento com as mortes.

Um romance comum, sem o brilho esperado de um suspense policial.

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Valdemir Martins

24.04.2025

Fotos: 1. Capa do livro; 2. O antigo hotel nas montanhas nevadas; 3. O trem quebrado próximo ao hotel; 4. A autora Anne Holt.

5 de mai. de 2025

Oliver Twist, um memorial da miséria humana.

Não se pode ler Oliver Twist sem conhecer a origem pobre e problemática de seu autor, o inglês Charles Dickens. Escrito em episódios publicados na revista literária britânica Bentley’s Miscellany durante dois anos - e nesse interregno como um livro  -, a obra é resultado de uma infância e adolescência problemática e curiosa que serviu de inspiração para a história de um órfão em Londres no século XVIII.
Rico em miséria, o livro tem um início tragicômico ao descrever as condições e diálogos do nascimento do pequeno Oliver e de seu primeiro livramento aos oito anos. A partir daí, o pequeno passa por todo o tipo de sofrimento, num texto espetacular de Dickens, impregnado de ironia e crítica dissimulada aos adultos que tudo decidem na vida de crianças órfãs naquela pequena cidade natal de Oliver, obscura, ignorante e violenta. A dramaticidade expressa pelo autor é superlativa.

O menino foge então para a parte também violenta e imunda de Londres e sua vida muda novamente. Dickens não perde a chance de despejar suas críticas sociais a cada nova situação. Chega até a criticar os filósofos que perdem tempo em reflexões e divagações muitas vezes fúteis e vazias, que nada de prático acrescentam à vida das pessoas. Atua como narrador e pondera com o leitor algumas situações do enredo, numa incrível empatia e intimidade.

Em sua crônica social, Dickens transporta-nos para aventuras nebulosas, obscuras e criminosas. O bem é algo raro e muitas vezes subliminar e ambíguo, mas incomum. Nas escassas cenas de felicidade do garoto, o autor capricha no tom poético. E, como um bom clássico, a obra tem diversas sequências prolixas, com narrativas minuciosas de criatividade poética e função estética, o que poderá resultar em enfadonhas para alguns leitores. Porém, necessárias na medida em que criam ambientações e trazem esclarecimentos sobre lugares e personagens. Além de abrilhantar literariamente a obra.

A partir de sua terceira parte, o livro explode em ação. E as revelações crescem aos borbotões, ao tempo em que um crime horroroso começa a dar o fecho à história. E a degradação física e psíquica de um condenado transforma o quase final da obra numa lição de como expressar em letras a angústia e o desespero, contagiando o leitor. E, a seguir, um final esperadamente feliz, por tratar-se da vida de um pobre e indefeso menino.

Aliás, Oliver, o pretenso protagonista, tem sua relevância diluída perante o protagonismo de outros fortes personagens, num jogo de participações marcantes desta muito bem elaborada trama urdida no talento de Dickens.

Neste que é um de seus primeiros trabalhos, Charles Dickens já demonstra seu enorme talento como o maior romancista e mais popular dos gerados na era vitoriana. Tornou-se, pelo conjunto de sua obra, o mais respeitado escritor do realismo britânico.

Uma obra para se conhecer antes de ler sua considerada obra prima David Copperfield, um dos mais importantes romances do século XIX. E também o mais autobiográfico de Dickens.

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Valdemir Martins
08.04.2025

Fotos: 1. Capa do livro; 2. A revista literária britânica Bentley’s Miscellany; 3. O bedel do orfanato; 4. O Judeu meliante; 5. A perseguição; 6. O autor Charles Dickens.