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29 de out. de 2025

Quando O Mundo se Despedaça

O medo sempre leva-nos a transformações, às vezes superficiais ou até mais profundas, como registra em sua obra magistral O Mundo se Despedaça, o premiado romancista e poeta nigeriano Chinua Achebe, considerado um dos grandes romancistas do século XX. Aqui, o medo de ser fraco torna os homens fortes e o medo de despedaçar o nosso mundo, leva-nos à luta. 

Mais uma vez, a literatura africana surpreende-me além de Mia Couto e J. M. Coetzee. O que, então, para mim, deixa de ser novidade também após as leituras de A mais recôndita memória dos homens* do senegalês Mohamed Mbougar Sarr e Sobrevidas** do Nobel tanzaniano Abdulrazak Gurnah. 

Numa linguagem objetiva, sem deixar de ser poética "... à medida que a voz do pregoeiro ia sendo gradualmente engolida pela distância, o silêncio retornava ao mundo, um silêncio vibrante, que se fazia mais intenso com o trilo universal de milhões de insetos na floresta." Achebe conta-nos a história de um herói eventual, forjado na decadência do pai e na transformação pessoal em um homem forte, exatamente à sombra do fracasso, sempre.

Achebe leva-nos para o centro da vida tribal da etnia ibo. Na região de Ibolândia (terra dos Ibos), no sudeste da Nigéria, no início do século XX , predomina um sistema social baseado nos laços familiares, no clã e na linhagem, um sistema em que existe grande correspondência entre a proximidade do parentesco, a da moradia e a dos deveres coletivos. Nosso protagonista é um temido líder regional por seu rigor, honestidade, perseverança e por sua força de trabalho. 

Numa obra onde setenta por cento de seu texto fala dos costumes e personagens regionais - belíssimos ou grotescos - dos clãs da tribo Umuófia nigeriana - que por sua dinâmica prende-nos na leitura -, não surpreende a chegada do homem branco. E no formato de sempre, querendo impor sua religião sobre os cerimoniais e mitos tradicionais dos nativos e explorando seus sentimentos. Primeiro passo para apaziguamento e dominação, para em seguida introduzirem um governo e todo seu belicismo. 

E num diálogo comparativo sobre as duas religiões, Achebe escancara os malefícios e exacerbações de ambos os cultos. Principalmente quanto ao fato de que os deuses são sempre temidos, mas nunca adorados por sua bondade. Seria correto falar-se em Civilização Nigeriana? Infelizmente, diante da força opressora e do acovardamento de um povo, os homens que se forjaram fortes tendem a capitular diante de seu povo que fugiu à luta. E se despedaçou. A civilização intrusa organizada e gananciosa dos deuses civilizados venceu a civilização nigeriana, a qual nem seus próprios deuses a protegeram.

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Valdemir Martins

15.07.2025

*https://contracapaladob.blogspot.com/2025/06/a-mais-recondita-memoria-dos-homens.html

**https://contracapaladob.blogspot.com/2022/10/obra-imensamente-humana-descrevendo.html

Fotos: 1. Capa do livro; 2. Localização da aldeia; 3. Núcleo familiar da aldeia; 4. As meninas da tribo; 5. O autor Chinua Achebe. 

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