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5 de dez. de 2018

Vidas Secas: no título, a substância da obra.

Além do óbvio, pouquíssimos livros condensam em seu título o conteúdo da obra. A genialidade literária do escritor e jornalista alagoano Graciliano Ramos consegue esta proeza em sua obra máxima Vidas Secas.

Apesar de um modernista da linhagem documental, até pelo fato de ser efetivamente um jornalista, criou esta obra que o coloca dentre os mais expressionistas escritores a retratar o sertão como Rachel de Queiroz, João Cabral de Melo Neto e José Lins do Rêgo. Vidas Secas é um redemoinho da vida no pleno sertão nordestino brasileiro: não adianta tentar escapar da secura de tudo, pois a roda viva do destino conduz todos para a espreita da morte.

Cena do filme de Nelson Pereira dos Santos
A obra traz uma família de retirantes atravessando a caatinga ressequida no sertão nordestino em busca de onde morar. À frente o Menino mais Velho e o Menino mais Novo – como são designados em todo o texto – acompanhados da fiel cadela Baleia e seguidos pelos pais Fabiano e Sinhá Vitória. No entorno a imensidão da terra ressequida e rachada, o céu azul limpo e brilhante e aqui e ali a sombra esquelética de mandacarus e quixabeiras esturricadas. Avizinham-se então de uma casa abandonada quando suas forças já os abandonavam.

Chega finalmente a chuva e com ela o dono da casa que é também o titular do armazém da cidadezinha próxima. Fazem um acordo e a família passa a trabalhar para o novo patrão em troca de moradia. Em meio às brincadeiras dos meninos e da Baleia ocorrem as encrencas do pai na cidade, com jogo, bebedeiras, prisão e quermesse. E, entrementes, Fabiano descobre que está sendo fraudado pelo patrão. Depara-se também, admirado, com a inteligência da sofrida mulher. Demitido por reclamar da extorsão, voltam à jornada retirante pelo sertão à procura de nova oportunidade.

Baleia e o Menino mais Novo
A obra caracteriza-se pela belíssima linguagem regional e pelo prodigioso poder de síntese de Graciliano, expressando com exíguas palavras e belíssimas construções as situações da narrativa. No seu neorrealismo regional consegue colocar-nos dentro de uma cena narrando local, emoções e ações de uma só penada. Há pouquíssimo diálogo entre os protagonistas, todavia um profundo amor os une apesar da vivência isolada de cada um.

Dos doze capítulos, Graciliano dedica cinco à família; um capítulo a cada membro. Provavelmente a mais emocionante passagem seja o capítulo inteiro dedicado à morte da cadela Baleia. E o remorso que marca o restante do livro. Na realidade, cada capítulo da obra pode até ser lido separadamente, pois Graciliano os escreveu como se fossem contos – a assim publicou alguns deles no “O Jornal” carioca, dando origem ao livro.

Graciliano Ramos e sua obra máxima
 Não deixa de ser posto pelo autor o aspecto político, entremeando à história o problema social nordestino confrontado com o poder econômico e a força do Estado. Concomitantemente à tragédia física de uma vida animalesca, Graciliano explora também o drama psicológico de uma esposa inconformada com aquele tipo de vida, do marido angustiado por se sentir inferior - pois além de não saber ler ou calcular, não era dotado de racionalidade -, e por não poder proporcionar vida melhor, principalmente aos filhos que se divertem e crescem como animais brincando na lama com a terceira irmã Baleia. Ambos, Fabiano e Sinhá Vitória, sonham em ter o aconchego do vizinho da antiga fazenda, seu Tomás da Bolandeira, letrado e com vida de conforto, para se livrar de suas vidas secas.

Valdemir Martins
30/11/2018

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PS: A Editora Record acaba de lançar uma belíssima edição comemorativa dos 80 anos da obra, em capa dura, além do texto integral e um fac-símile do manuscrito original com as emendas e correções de próprio punho do autor.

3 comentários:

  1. Sou apaixonado por Vidas Secas de Graciliano Ramos. Realmente uma obra prima da literatura brasileira.

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  2. Caso queira seguir o blog, clique no link superior à direita. Obrigado

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