A dramaticidade por vezes e alternadamente irônica é uma marca na narrativa e uma distinção no estilo do autor. Chega a ser a “linguagem oficial” do fato mais importante do enredo, o que enriquece a obra e quebra toda uma rígida expectativa e tensão proporcionada pela peste e pela incompetência de alguns servidores municipais, burocratas e das lideranças. Seus paralelos traçados com momentos históricos - como a Revolução Francesa, por exemplo - galgam as raias da ironia (ou mesmo do deboche). Outro fato que chama a atenção é que o autor pode ter possivelmente retratado a figura do idolatrado Mustafa Kemal Atatürk - fundador da República da Turquia - no personagem herói oficial Kamil, o que lhe rendeu um processo na cidade de Esmirna, na Turquia.
Como insinua ser a normalidade nos governos islâmicos, o autor os representa no livro como algo anárquico, cheio de fanatismo, ignorância e bestialidade, além do oportunismo. Por sua franca incompetência, neste caso, a obra o denomina “gerenciador da anarquia da peste”, com as políticas absurdas e equivocadas que foram implementadas.
Valdemir Martins
26.07.2024
Fotos: 1. Capa do livro; 2. Mapa da região; 3. O sultão Abdul Hamid II; 4. O porto de Mingheria; 5. As bolhas da peste; 6. A devastação da peste; 7. As fugas da ilha; 8. O enforcamento; 9. Os líderes religiosos; 10. O palácio Topkapi em Istambul; 11. O autor Orhan Pamuk.