Desde sempre os Homens
aprenderam a sobreviver e acabaram por dominar a inóspita e cruel região do círculo polar
ártico. Civilizações remotíssimas por lá estiveram a partir de 5 mil a.C.,
seguidas por vikings e mais recentemente, a partir do século XIX, com modernas
embarcações e até balões, o Homem Branco
frustra-se e não sobrevive às rigorosas intempéries e impensáveis condições de
sobrevivência glacial. Foram inúmeras as expedições fracassadas, com muitas
tragédias, enfrentadas por eles que, por mais que se organizassem, não tinham
um mínimo de preparo e de conhecimento do que realmente é viver à média de 70
graus negativos no inverno e a dias e noites que duram até seis meses.
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Cena do filme |
Somente os Homens
- como se intitulam os Esquimós - conseguiram
essa proeza, lá vivendo desde tempos imemoriais e desenvolvendo uma cultura
própria, inacreditável, inaceitável e rigorosamente difícil para a civilização
moderna. A partir de fatos reais, o ítalo-americano Hans Ruesch escreveu um dos mais estranhos e fascinantes romances de
nossos tempos: Sangue sobre a Neve (Top
of the World), já imortalizado também em filme por Anthony Quinn e Peter O’Toole em 1960.
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Primeiro contato com brancos |
Traduzido para mais de vinte idiomas e com um grande número
de edições, esta obra alcançou sucesso e popularidade. É um romance
emocionante que não só tem o apelo e charme do exótico. Através de suas
páginas, vivemos as aventuras e desventuras de uma pequena família de esquimós
naquelas extensões intermináveis de gelo e na longa
noite glacial.
Os costumes, os mitos, a atmosfera íntima do iglu, as
corridas vertiginosas nos trenós, a caça, enfim, toda a vida familiar dessas
pessoas simples e cordiais está neste romance emocionante e doloroso.
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Iglu típico da região polar |
Esta
realista história de Ernenek, a formação de sua família, as agruras por que
passam, o difícil relacionamento com os brancos que invadem seus territórios e
desrespeitam sua cultura, e suas tradições nada costumeiras para nós, torna-se
uma dramática e reveladora novela. Numa linguagem objetiva, célere e
contundente, Ruesch escancara a degradação de uma cultura pura, enraizada nas
mais dramáticas e primitivas técnicas de sobrevivência, nas quais qualquer ser
humano da atualidade jamais conseguiria viver.
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Meio de transporte único |
O
povo esquimó, na época de ambientação do livro, tem características distintas
do homem branco. Eram analfabetos, com valores, crendices, técnicas,
conhecimentos, hábitos diferenciados das demais civilizações, com maneiras caracterizadas
de se relacionarem com o mundo e com a sua comunidade. Por isso, a maioria das
passagens da obra é surpreendente, trazendo muito suspense, escatologia, situações
tristes e outras vezes cômicas, mas sempre mantendo aquilo que deveria ser um
mantra na sociedade moderna: alegria, ingenuidade, honestidade e solidariedade.
Sabe-se que os
esquimós enxergam mais de 30 tipos de branco (cor), ele não nasce com essa
capacidade, ele a adquire, ele a aprende. Isto significa que não é necessário ser
filho biológico de um Esquimó para conseguir enxergar os 30 tipos, basta que
desde criança seja ensinado por um adulto.
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Vila esquimós e brancos |
Mas,
como habitual, o Homem Branco chega para deteriorar tudo, com suas armas, suas
bebidas, seus costumes e, nefandamente, com seu credo. Como acontece na
atualidade, os pregadores religiosos confundem, aterrorizam, ameaçam e exploram
os ignorantes, os puros e os ingênuos. “As regras do Homem Branco, que ao
invés de trazer algo de útil, que sirva para alguma coisa, e que esteja em
falta, como mulheres, os homens trouxeram suas leis, que para os Esquimós não
servem para nada, apenas para gerar discórdia e conflito”, disse Ernenek. É o que retrata este dinâmico romance.
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Hans Ruesch |
Com
certeza, por causa desses líderes religiosos e da ganância da civilização, hoje
os esquimós estão praticamente extintos ou radicalmente modificados.
No entanto, este é um livro para ser guardado para o
entretenimento, a cultura e principalmente como guia de sobrevivência do Homem
Branco – ou quem o suceder – quando vier a nova Era Glacial insistentemente
apregoada pelos cientistas do mau tempo e os catastrofistas de sempre. Guarde o
seu exemplar. Vai que eles estão certos... Este livro lhe será muito útil.
Valdemir Martins
07.10.2019